terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Carlos Vaz Marques entrevista Lobo Antunes para o Festival LER

"A amizade não é mais do que uma dedicada atenção."

"A amizade é como o amor. É absoluto e instantâneo. Assim que conhecemos um amigo verdadeiro somos logo amigos de infância."

"Estou muito grato à guerra. Pensava que tudo rodava à minha volta e ali percebi que somos um no meio de muitos."

"Enquanto estivermos de mão dada com alguém nada nos pode acontecer. Quando estava à espera da anestesia na minha operação o cirurgião deu-me a mão em silêncio e percebi que nada de mal me podia acontecer."

"Não podemos viver sem a noção de eternidade. Mesmo que não a tenhamos sempre presente. Um bom médico é o que nos devolve a eternidade"

é difícil falar sobre o que é ouvir Lobo Antunes. a experiência é de tal forma devastadora e rica que fica sempre pouco que dizer. mesmo o Carlos Vaz Marques que tantas vezes é genial na sua forma de abordar os entrevistados aqui não conseguiu sempre ter a estaleca necessária. e o Lobo Anutnes apresentou-se coloquial e descontraído. mas a descontracção dele acaba sempre por ser  um gigante de palco. só pela naturalidade, pelo que pensa e pelo que sente. pelo que diz como quem fala de assuntos coloquiais sem o ser. foi divertido e comovente. o sentido de humor dele é imbatível. e a forma como salta de um frase divertida para uma que nos desfaz em peças é inacreditável.

falou-nos da sua forma de escrever. que não escreve romances, nem poemas, que não há nome para o que escreve. que vem apenas do editor a decisão de escrever "romance" na capa. diz que gostava de escrever mais, outras coisas. "coisas" neste sentido da não definição da forma. queria deixar depois de morrer o mesmo que o pai lhe respondeu que queria deixar aos filhos antes de morrer: "o amor pelas coisas belas".

os seus livros têm muitas vozes femininas. Lobo Antunes cresceu no meio de rapazes e procurou sempre a voz feminina no seu entendimento do mundo. como uma procura por uma irmã que nunca teve. e é aí que se pode considerar este último livro, não é meia-noite quem quer, como um livro autobigráfico - não nos factos mas nessa procura da voz feminina que procurou desde a infância.

parte da entrevista foi aquilo que ele chamou, desagradado, uma abordagem de termos técnicos. disse que os romancistas não deviam usar advérbios de modo nem demasiados adjectivos - que havia quem o fizesse e muito bem mas que deveria ser um génio para o fazer. disse também que um livro não pode pretender estar em altas durante todas as páginas - muitos romancistas novos na minha opinião ignoram esta regra, o que é trágico. o romance deveria crescer e diminuir para que o leitor o possa acompanhar de forma mais orgânica.

Carlos Vaz Marques estava perante um monstro das palavars e podemos dizer que se safou muito bem, como sempre. só no final não levou a dele avante, ele que nunca desiste de uma pergunta, não conseguiu que Lobo Antunes desse conselhos de leitura. Carlos Vaz Marques não desiste de uma pergunta e posso garantir-vos que fez de tudo e deu todas as voltas. mas não conseguiu.


(eduardo salavisa)

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