Não faças Terrorismo Poético para outros artistas, fá-lo para pessoas que não perceberão que o que acabaste de fazer é arte. Hakim Bey
terça-feira, 27 de agosto de 2013
CABUUUUUUM!!!
“os prémios literários significam sempre o prémio do bem escrever e são sumamente ridículos pois se, como creio, o génio é incompatível com a habilidade, à humanidade só os génios interessam por muito que se esfreguem os talentos à porta da humanidade” Cesariny
surrealisticando
You are welcome to Elsinore
Entre nós e as palavras há metal fundente
entre nós e as palavras há hélices que andam
e podem dar-nos a morte violar-nos tirar
do mais fundo de nós o mais útil segredo
entre nós e as palavras há perfis ardentes
espaços cheios de gente de costas
altas flores venenosas portas por abrir
e escadas e ponteiros e crianças sentadas
à espera do seu tempo e do seu precipício
Ao longo da muralha que habitamos
há palavras de vida há palavras de morte
há palavras imensas, que esperam por nós
e outras, frágeis, que deixaram de esperar
há palavras acesas como barcos
e há palavras homens, palavras que guardam
o seu segredo e a sua posição
Entre nós e as palavras, surdamente,
as mãos e as paredes de Elsenor
E há palavras nocturnas palavras gemidos
palavras que nos sobem ilegíveis à boca
palavras diamantes palavras nunca escritas
palavras impossíveis de escrever
por não termos connosco cordas de violinos
nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar
e os braços dos amantes escrevem muito alto
muito além do azul onde oxidados morrem
palavras maternais só sombra só soluço
só espasmos só amor só solidão desfeita
Entre nós e as palavras, os emparedados
e entre nós e as palavras, o nosso dever falar
Mário Cesariny
Pena Capital
Lisboa, Assírio & Alvim, 1982
terça-feira, 20 de agosto de 2013
Psyche, de Leandro Morgado, no Fringe Festival
fui a Edimburgo ver o novo espectáculo do Leandro, o Psyche. assisti a três apresentações mas deu para ficar com uma ideia do que era. umas poucas semanas antes do início do Festival assistimos na Malaposta ao try-out do espectáculo e notou-se uma grande evolução nesta forma "final" (sempre entre aspas).
o Psyche fala sobre o cérebro. não sobre a massa que ele é mas sobre a mente, a forma como ela nos manipula e como pode ser manipulada. o Leandro apresenta-nos o que não ficamos bem a saber se é um espectáculo de magia, comédia, mind-reading ou outra coisa qualquer. como muitas vezes disse para descrever outros espectáculos, este é o espectáculo dele. como sempre o ponto forte é o conceito, a forma como ele nos fala do cérebro. a presença do conceito é de tal maneira forte que a mim me habituou a um tipo de espectáculo que aumenta de facto a fasquia. um espectáculo de magia e comédia que poderia ser incrível deixa-me agora a perguntar o porquê de o ter ido ver (eu tenho alguma comichão com o simples entertenimento, quem me conhece sabe isso, acho válido mas interessa-me pouco, em diversas áreas artísticas). o espectáculo Psyche acrescenta-nos algo, explicando alguns fenómenos e passando-nos algumas informações sobre a forma como o cérebro funciona, ilustrando essas informações com truques e personagens. torna-se interessante verificar que o Leandro não pretende enganar ninguém dizendo que a mente dele é diferente da nossa, ou com poderes especiais, ele não lê mentes. não faz o fácil caminho do show do mentalista que adivinha que palavra se forma na cabeça de alguém. aliás o Leandro satiriza os próprios mentalistas através de uma das suas personagens não deixando no entanto de surpreender ao adivinhar uma palavra escolhida ao acaso num livro inteiro (talvez o truque mais forte do espectáculo).
com truques fortes, insuspeitos, momentos hilariantes de contacto com o público, este foi um espectáculo que funcionou de forma intimista. havia uma relação muito intensa entre as pessoas que estavam na sala e o espectáculo que estava a decorrer, sentia-se empatia com as personagens que iam surgindo, inclusive com Gustav, o Macaco Mentalista. esta intimidade foi talvez o que considero o ponto mais forte do espectáculo no Fringe. ajudou uma merecida e constante sala cheia e composta.
durante duas semanas, as primeiras do Leandro no Fringe (primeiras de muitas outras esperamos nós), foi possível perceber o humor diferente do nosso, testar o que funciona e que não funciona, os ritmos diferentes que tem de usar enquanto mágico e comediante sobretudo. será aconselhável numa próxima vez um try-out para aqueles lados para que ele possa testar antecipadamente o que pode funcionar menos bem. eu cheguei nos últimos três dias e vi um espectáculo coeso e interessante. hilariante e charmoso. e vi um artista de palco que sabe trabalhar sozinho, sabe que o público é parte das suas armas de trabalho e que não está, em nenhum momento, longe das pessoas.
fica-nos na curiosidade o que se seguirá. o que se pode dizer é que o Leandro superou a prova Fringe. uma primeira experiência que só pode dizer o melhor do trabalho dele e dele próprio. afinal pensemos bem nisto, pela primeira vez, um português sozinho, nos palcos do Fringe (na rua já tínhamos portugueses), constrói um one man show (with a monkey), sem nunca ter feito no Reino Unido um espectáculo semelhante e, ainda assim, funciona desta forma. eram 2500 espectáculos e ele era um deles e teve sempre sala mais do que pronta para receber o espectáculo. só tenho uma coisa a dizer, irritando de passagem quem não gosta de tantas expressões "de fora", it was fukin great.
o Psyche fala sobre o cérebro. não sobre a massa que ele é mas sobre a mente, a forma como ela nos manipula e como pode ser manipulada. o Leandro apresenta-nos o que não ficamos bem a saber se é um espectáculo de magia, comédia, mind-reading ou outra coisa qualquer. como muitas vezes disse para descrever outros espectáculos, este é o espectáculo dele. como sempre o ponto forte é o conceito, a forma como ele nos fala do cérebro. a presença do conceito é de tal maneira forte que a mim me habituou a um tipo de espectáculo que aumenta de facto a fasquia. um espectáculo de magia e comédia que poderia ser incrível deixa-me agora a perguntar o porquê de o ter ido ver (eu tenho alguma comichão com o simples entertenimento, quem me conhece sabe isso, acho válido mas interessa-me pouco, em diversas áreas artísticas). o espectáculo Psyche acrescenta-nos algo, explicando alguns fenómenos e passando-nos algumas informações sobre a forma como o cérebro funciona, ilustrando essas informações com truques e personagens. torna-se interessante verificar que o Leandro não pretende enganar ninguém dizendo que a mente dele é diferente da nossa, ou com poderes especiais, ele não lê mentes. não faz o fácil caminho do show do mentalista que adivinha que palavra se forma na cabeça de alguém. aliás o Leandro satiriza os próprios mentalistas através de uma das suas personagens não deixando no entanto de surpreender ao adivinhar uma palavra escolhida ao acaso num livro inteiro (talvez o truque mais forte do espectáculo).
com truques fortes, insuspeitos, momentos hilariantes de contacto com o público, este foi um espectáculo que funcionou de forma intimista. havia uma relação muito intensa entre as pessoas que estavam na sala e o espectáculo que estava a decorrer, sentia-se empatia com as personagens que iam surgindo, inclusive com Gustav, o Macaco Mentalista. esta intimidade foi talvez o que considero o ponto mais forte do espectáculo no Fringe. ajudou uma merecida e constante sala cheia e composta.
durante duas semanas, as primeiras do Leandro no Fringe (primeiras de muitas outras esperamos nós), foi possível perceber o humor diferente do nosso, testar o que funciona e que não funciona, os ritmos diferentes que tem de usar enquanto mágico e comediante sobretudo. será aconselhável numa próxima vez um try-out para aqueles lados para que ele possa testar antecipadamente o que pode funcionar menos bem. eu cheguei nos últimos três dias e vi um espectáculo coeso e interessante. hilariante e charmoso. e vi um artista de palco que sabe trabalhar sozinho, sabe que o público é parte das suas armas de trabalho e que não está, em nenhum momento, longe das pessoas.
fica-nos na curiosidade o que se seguirá. o que se pode dizer é que o Leandro superou a prova Fringe. uma primeira experiência que só pode dizer o melhor do trabalho dele e dele próprio. afinal pensemos bem nisto, pela primeira vez, um português sozinho, nos palcos do Fringe (na rua já tínhamos portugueses), constrói um one man show (with a monkey), sem nunca ter feito no Reino Unido um espectáculo semelhante e, ainda assim, funciona desta forma. eram 2500 espectáculos e ele era um deles e teve sempre sala mais do que pronta para receber o espectáculo. só tenho uma coisa a dizer, irritando de passagem quem não gosta de tantas expressões "de fora", it was fukin great.
(fotos andré santos)
domingo, 18 de agosto de 2013
estive em edimburgo a acompanhar o espectáculo do leandro e foi assim isto um relance do que vi
e já falo das ideias que começaram a borbulhar. boris vian volta a desenhar-se na cabeça!
Paul Currie
East End Cabaret
BLAM! - Kristján Ingimarsson / Neander
Pete Firman
The Colour Ham
terça-feira, 6 de agosto de 2013
as maravilhas que encontramos numa feira de antiguidades em santa cruz
vendidas por uns adolescentes que, claramente, se estavam a desfazer da biblioteca do avô. raridades atrás de raridades!
Manuel de Lima
quem tem um pai que adora Manuel de Lima e nos traz os livros todos num saco só porque soube que queria ler mais do autor, tem tudo.
A Amante Holandesa
li o rentes de carvalho porque muitos me falavam dele e senti como uma falha. creio que elevei as expectativas e isso é algo que me começa a não poder fazer uma vez que poucos livros me enchem as medidas quando o faço. não vou dizer que não gostei da amante holandesa e para o mostrar por palavras vou dizer quais os pontos fortes do livro. por um lado a limpeza na escrita, muito difícil de encontrar hoje em dia. tão limpa que quase poderia roçar o demasiado plana se não fosse facilmente identificável o discurso com a personagem principal, um homem que acredita que a sua presença e personalidade são exactamente assim - planas e aborrecidas. ao fundir a personagem com a história o livro torna-se ainda mais uma história contada pelo próprio narrador e não tanto um livro do autor - o autor dissolve-se no narrador.
senti apenas que contava, acima de tudo, uma história e talvez seja aí, nesse sítio, que não me tenho ultimamente posicionado como leitora. os livros, a meu ver, têm de traduzir pessoas, recados, partilha de identidades e marcas definidoras e surpreendentes dessa mesma identidade. deixa de me interessar um livro em que a história assume o papel principal. pode ser boa ou não, interessante, surpreendente, o que seja - não é aí que se deverá centrar o ponto forte do livro. aqui senti que era o que acontecia e a história, além de plana, tem alguns buracos que não fazem verdadeiramente muito sentido.
não me distanciei de todo deste autor e tenho falado com muitas pessoas que gostam dele para entender o que me terá falhado mas a conclusão final é apenas que, neste momento, ele não se encaixa no meu espaço de leitora e sim no daqueles que gostaram muito dele. vou deixá-lo descansar e quem sabe noutra altura poderá fazer todo o sentido.
senti apenas que contava, acima de tudo, uma história e talvez seja aí, nesse sítio, que não me tenho ultimamente posicionado como leitora. os livros, a meu ver, têm de traduzir pessoas, recados, partilha de identidades e marcas definidoras e surpreendentes dessa mesma identidade. deixa de me interessar um livro em que a história assume o papel principal. pode ser boa ou não, interessante, surpreendente, o que seja - não é aí que se deverá centrar o ponto forte do livro. aqui senti que era o que acontecia e a história, além de plana, tem alguns buracos que não fazem verdadeiramente muito sentido.
não me distanciei de todo deste autor e tenho falado com muitas pessoas que gostam dele para entender o que me terá falhado mas a conclusão final é apenas que, neste momento, ele não se encaixa no meu espaço de leitora e sim no daqueles que gostaram muito dele. vou deixá-lo descansar e quem sabe noutra altura poderá fazer todo o sentido.
segunda-feira, 5 de agosto de 2013
Livreiro da Esperança "Especial Culsete - 40 Anos"
Manuel Medeiros chegou a Setúbal vindo dos Açores, sua terra natal, para logo se envolver em projectos de animação e divulgação da leitura. Um ano antes do 25 de Abril, aproveitando o balanço de uma cooperativa de livros que a Pide não tinha conseguido encerrar, funda com Fátima Ribeiro de Medeiros a livraria Culsete, que permanece hoje como uma das mais activas livrarias independentes do país.
Ao longo destes 40 anos, Manuel e Fátima Medeiros fizeram crescer a Culsete no espaço das suas estantes – onde se encontra um fundo de catálogo completo e escolhido com o cuidado de quem conhece as páginas que vende, para além das novidades que vão chegando ao mercado –, tanto como para fora dos metros quadrados que delimitam a livraria. Pela Culsete têm passado escritores, ilustradores, editores, promotores da leitura, jornalistas, outros livreiros, muitos leitores, enfim, gentes do livro. É na Culsete que se realiza o Encontro-Livreiro e tem sido na Culsete que várias gerações de leitores setubalenses encontram o seu alimento em letra de forma, sempre bem aconselhados pelos dois livreiros.
Nos 40 anos da Culsete, e porque é de elementar justiça fazê-lo (esta é a primeira decisão que, no âmbito do Encontro-Livreiro, não conta com a participação do Manuel e da Fátima), decidimos atribuir o diploma
LIVREIRO DA ESPERANÇA
"ESPECIAL CULSETE - 40 ANOS"
a
Manuel Medeiros e Fátima Ribeiro de Medeiros
a
Manuel Medeiros e Fátima Ribeiro de Medeiros
e convidar todos quantos se queiram associar a esta singela homenagem a subscrevê-la, até ao dia 1 de Outubro de 2013 (dia em que se completam os 40 anos da abertura da livraria), enviando para encontro.livreiro@gmail.com uma mensagem com indicação de NOME, PROFISSÃO/EMPRESA e LOCALIDADE. Apelamos ainda a que, por esta via ou directamente no blogue, nos façam chegar depoimentos e comentários.
Bem hajam, Manuel e Fátima!
Sara Figueiredo Costa - Blogue «Cadeirão Voltaire», jornalista e crítica literária (Lisboa)
Joaquim Gonçalves - Livreiro, A das Artes (Sines)
Rosa Azevedo - Blogue «Estórias com Livros», ex-livreira, produtora na Ordem dos Arquitectos (Lisboa)
António Alberto Alves - Livreiro, Traga-Mundos (Vila Real)
José Teófilo Duarte - Designer gráfico (Lisboa)
Luís Guerra - Sistema Solar (Lisboa)
1 de Agosto de 2013
sábado, 3 de agosto de 2013
O da Joana, Valério Romão, Abysmo
Valério Romão começou a prometer,
aos meus olhos, no primeiro número da Granta. o Autismo vem a
caminho, em breve falarei dele.
O da Joana conta um só episódio
traumático para Joana e para Jorge, o marido. depois de uma primeira
cena genial, envolvente e misteriosa que nos embarca numa cena que
nos corta a respiração entramos numa história onde achamos, durante
poucas linhas, que podemos respirar do ambiente em que embarcámos na
primeira cena. mas não. a espiral descendente deste livro começa
logo no início e não termina. nunca percebemos o ponto de vista
real do livro, o que, a meu ver, é o que de mais interessante e
inovador podemos ler neste livro – ao nunca percebermos o ponto de
vista que estamos a ler nunca sabemos o que é real e o que é fruto
da crescente loucura da personagem. nunca percebemos em que universo
estamos. é uma escrita corrida e respirada. Ao mesmo tempo
asfixiante e dolorosa. um exercício de estilo e uma forte
manipulação psicológica. uma manipulação que nos faz amar e
detestar a Joana, sentir piedade e medo, angústia e uma doce
simpatia. nada é pacífico naquele livro que se lê rápido e nos
deixa um rasto de angústia duradouro. um livro que alterna entre profundidade
e tona de água. o que acontece à própria Joana, que vem por vezes à tona de
água da realidade. mas nós nunca percebemos onde está a sua, logo, a nossa realidade. só podemos adivinhar.
não é um livro fácil mas é um livro
necessário para quem gosta de escritores. e o Valério Romão é
daqueles bons escritores que prometem muito. E isso é tão raro como
incrível. Fazia falta o Valério Romão antes de saber que existia. fazia falta alguém que usasse a arte crua das palavras sendo
escritor sem a arte do enfeite. aquilo é a verdade – a pior das verdades,
mas a verdade. e poucas vezes é fácil falar da verdade. e ele consegue. sem medos.
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