em Estrada para Los Angeles (edição Alfaguara 2013, primeira em Portugal) Arturo Bandini é um adolescente. pareceu-me durante toda a leitura que era neste livro que Fante o apresentava como figura tão indescritível como incómoda. não há nada de doce em Bandini. não há amabilidade ou cortesia ou sociabilidade. Bandini é o escritor por conceito sem ser de todo conceptualizado ou encaixado em categorias.
este livro poderia ser (e será) como um prólogo dos outros. o livro posiciona-se no olhar do jovem escritor que deverá sustentar a mãe e a irmã e deixa-nos perceber sem qualquer momento obscuro ou misterioso o caminho absolutamente quotidiano de Bandini. e esse absolutamente quotidiano é sempre extraordinário. com absoluto desprezo pelo maquinal e pelo funcional Bandini é um escritor violento, opressivo, contra a igreja e acérrimo defensor do seu génio. a mãe e a irmã são personagens de grande importância ainda que inicialmente pareçam estar caricaturadas. por um lado Mona, a irmã, católica fervorosa (e será assim tanto ou é o que o irmão nos faz entender?) sempre pronta para mostrar ao irmão que a realidade não é aquela onde ele vive com a crueldade natural dos irmãos mas, claro, com o exagero certo de Fante. a mãe é a protectora, angustiada entre os dois e com a falta de dinheiro, personagem aparentemente plana que é apenas mãe mas com quem Bandini é capaz de algum carinho, muito leve, mas exemplar face à crueldade da sua convicção diária e vontade de destruição.
Bandini é incrível. Fante criou uma personagem incómoda, doente, violenta mas coerente. Este livro é o momento em que se forma assim, insuportável e surpreendente, sempre na calha de algo insuspeito e, no final, nada perigoso, ao contrário do que anuncia.
Fante é um escritor sem floreados, simples e quotidiano (no que isto pode ter de bom, note-se). parecendo (e por muitos criticado por isso) estar a escrever um romance do dia a dia está, na verdade, a criar uma personagem inesquecível cujo nome lhe sobrevive. eu tenho um fraquinho por personagens fortes, já sabem. e isto de criar uma personagem forte, insuportável, que nunca é descrita mas também não é narradora e que apenas vive (e é suficiente) de actos e diálogos, é criar uma obra de arte.
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