as questões de género e a procura de equidade estão muito longe de estar resolvidas. entrámos no séc. XXI muito mais esclarecidos e informados, mas o que realmente se coloca aqui em causa é de que forma passou essa informação e de que forma estamos a lidar com ela.
encontrei por essas redes sociais a referência a um novo "movimento", ou, na verdade, um hashtag, a nova forma de movimento cibernético. falava-se de #readwomen2014. procurei o artigo e encontrei-o aqui, no The Guardian. este artigo referia um estudo, este, levado a cabo pelas Women in Literary Arts, que referia a discrepância ainda existente entre mulheres e homens no mundo da edição.
vamos então, primeiro, aos factos. há mais homens a escrever, desde sempre. isso deve-se, no meu entender, a questões históricas em primeiro lugar, porque até há (demasiado) pouco tempo esse não era, culturalmente e socialmente, o lugar da mulher. depois ainda vivemos num mundo, e desenganemo-nos se pensamos o contrário, em que a mulher chama a si mais funções quotidianas quando vivem em família e em comunidade, ainda se dedicam mais aos filhos e à casa e essa tão desejada divisão de tarefas está a anos luz de ser uma realidade.
por outro lado os livros femininos são ainda estereotipados ao nível editorial se bem que aqui em Portugal, mais talvez do que na Inglaterra e nos EUA, por exemplo, isso já não seja tão marcante, as capas femininas (juntamente com a oferta de cachecóis, sacos brilhantes, entre outros) estão sobretudo ligadas a uma escrita de temas femininos que só por si, é já um apelo à discriminação. são livros que pretendem chegar a mulheres que insistem em manter-se nesse sítio dedicado às mulheres, erro de quem escreve, publica e lê. digo erro porque para mim esse mercado é um mercado a abater.
depois, mais difícil de ler e de atingir, temos então a discriminação ainda real e mais enevoada que afasta as mulheres da publicação e que liga as mulheres a má literatura (culpa desse mercado que disse que era para abater, têm aqui a razão). muitas vezes quando vendi livros tive dificuldade em vender uma rosa montero ou até uma carson mccullers por não acreditarem que poderia ser um bom livro.
portanto podemos concluir que há muito trabalho a ser feito. o que a Joanna Walsh faz neste artigo é lançar uma ideia. lermos livros de mulheres, fazermos o ranking mudar, percebermos como na nossa biblioteca também temos mais homens.
para mim esta ideia é perigosa e um verdadeiro tiro ao lado. o trabalho que tem de ser feito nas questões de género na literatura tem de ser muito mais profundo, a um nível mais trabalhoso. não se consegue atingir a equidade fazendo com que se leiam mulheres, porque são mulheres. eu leio mulheres e homens quando as mulheres e homens escrevem o que me interessa. se há menos mulheres a publicar pelas razões apresentadas a cima a minha biblioteca tem menos mulhers que homens. mas o problema não está aí, o problema está na formação de leitores e o que os leva a comprar ou não comprar um livro escrito por uma mulher. é nesse campo que os estudos de género têm de actuar. porque é tão grave não comprar um livro por ser escrito por uma mulher como comprá-lo por ser escrito por uma mulher. a intenção muda mas na base está o mesmo princípio - a discriminação. o trabalho tem de ser continuado até ao dia em que na cabeça de cada um o género não interessa e sim o livro em si. assim como em tudo, a leitura dos géneros é sempre uma realidade (porque eles existem e têm diferenças e essas diferenças não serão nem deverão ser diluídas) mas não um factor de decisão.
imagino que muitas pessoas que leiam este meu texto e os que apresentei a cima pensem que seja como for estou a ser chata, deixem lá a malta procurar livros de mulheres, mal não faz. o problema é que não gosto de soluções simplistas. é preciso pensar sempre as questões em profundidade para sermos certeiros. pode demorar mais tempo e ser muito mais complicado, mas acredito que poderá ser um caminho muito mais eficaz.
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